quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Decreto 7.627 - Regulamente a monitoração eletrônica

DECRETO Nº 7.627, DE 24 DE NOVEMBRO DE 2011.
 
Regulamenta a monitoração eletrônica de pessoas prevista no Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, e na Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 - Lei de Execução Penal.
A PRESIDENTA DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, da Constituição, e tendo em vista o disposto no inciso IX do art. 319 no Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, e nos arts. 146-B, 146-C e 146-D da Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 - Lei de Execução Penal,
DECRETA:
Art. 1o  Este Decreto regulamenta a monitoração eletrônica de pessoas prevista no inciso IX do art. 319 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, e nos arts. 146-B146-C e 146-D da Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984 - Lei de Execução Penal.
Art. 2o  Considera-se monitoração eletrônica a vigilância telemática posicional à distância de pessoas presas sob medida cautelar ou condenadas por sentença transitada em julgado, executada por meios técnicos que permitam indicar a sua localização.
Art. 3o  A pessoa monitorada deverá receber documento no qual constem, de forma clara e expressa, seus direitos e os deveres a que estará sujeita, o período de vigilância e os procedimentos a serem observados durante a monitoração.
Art. 4o  A responsabilidade pela administração, execução e controle da monitoração eletrônica caberá aos órgãos de gestão penitenciária, cabendo-lhes ainda:
I - verificar o cumprimento dos deveres legais e das condições especificadas na decisão judicial que autorizar a monitoração eletrônica;
II - encaminhar relatório circunstanciado sobre a pessoa monitorada ao juiz competente na periodicidade estabelecida ou, a qualquer momento, quando por este determinado ou quando as circunstâncias assim o exigirem;
III - adequar e manter programas e equipes multiprofissionais de acompanhamento e apoio à pessoa monitorada condenada;
IV - orientar a pessoa monitorada no cumprimento de suas obrigações e auxiliá-la na reintegração social, se for o caso; e
V - comunicar, imediatamente, ao juiz competente sobre fato que possa dar causa à revogação da medida ou modificação de suas condições.
Parágrafo único.  A elaboração e o envio de relatório circunstanciado poderão ser feitos por meio eletrônico certificado digitalmente pelo órgão competente.
Art. 5o  O equipamento de monitoração eletrônica deverá ser utilizado de modo a respeitar a integridade física, moral e social da pessoa monitorada.
Art. 6o  O sistema de monitoramento será estruturado de modo a preservar o sigilo dos dados e das informações da pessoa monitorada.
Art. 7o  O acesso aos dados e informações da pessoa monitorada ficará restrito aos servidores expressamente autorizados que tenham necessidade de conhecê-los em virtude de suas atribuições.
Art. 8o  Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 24 de novembro  de 2011; 190º da Independência e 123º da República.
DILMA ROUSSEFFJosé Eduardo Cardozo
Este texto não substitui o publicado no DOU de 25.11.2011

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Prof Leonardo Yarochewsky relata à Presidência da OAB/MG as dificuldades dos crimilalistas em Minas


Carta aberta ao Presidente da OAB-MG
Ilustre Dr. Luis Claudio Chaves, presidente da OAB seção de Minas Gerais, muito embora seja um direito fundamental, inalienável e constitucional (o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei - art. 133 da CF) cada dia que passa torna-se mais difícil exercer a advocacia, principalmente, a advocacia criminal.
Conscientemente ou não, algumas autoridades (Juízes, Promotores de Justiça e Delegados de Polícia) olvidam a norma constitucional e afrontam os direitos e garantias do exercício profissional.
Na seara criminal em nome do combate ao crime e do clamor público alguns juízes e delegados insistem em dificultar ou mesmo negar aos advogados constituídos acesso aos autos do inquérito ou mesmo do processo criminal. Isto, apesar da 14ª Súmula Vinculante do STF, em vigor há mais de dois anos, declarar que “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa”.
Vários processos que tramitam em sigilo ou segredo de justiça são vazados para imprensa com riqueza de detalhes e informações, mas ao advogado o acesso continua sendo restrito e dificultado.
Quando o cliente do advogado está preso (provisoriamente ou não), as dificuldades se multiplicam. O preso é levado até o parlatório algemado e escoltado por no mínimo dois agentes penitenciários e assim permanece quando da entrevista com seu advogado sem qualquer privacidade. O art. 7º, inc. III da Lei 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB) que diz ser direito do advogado comunicar-se pessoal e reservadamente com seus clientes tornou-se letra morta.
Infelizmente, caro Presidente da OAB-MG, algumas autoridades, ainda que minoritariamente, veem o advogado criminalista como inimigo, como aliado do crime, como um estorvo na realização da tutela jurisdicional.
Apesar do Estatuto da Advocacia proclamar que “não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público...” (art. 6 da Lei nº 8.906/94) o tratamento dado aos membros do Ministério Público por alguns magistrados, alguns, é totalmente diferenciado na própria condução do processo.
Com orgulho, senhor Presidente, exerço a advocacia criminal há mais de duas décadas, mas me preocupo com as centenas de jovens advogados idealistas que, ainda, acreditam nos direitos fundamentais para exercerem com denodo a profissão de advogado, me preocupo com aqueles que têm a responsabilidade de zelar pelo sagrado direito de defesa e que somente poderão fazê-lo se o advogado for realmente respeitado e efetivamente considerado imprescindível à administração da justiça.
Como advogado criminalista, amante da liberdade e da justiça faço minha as palavras de Antônio Evaristo de Moraes Filho quando diz: “Aos que insistem em não reconhecer a importância social e a nobreza de nossa missão, e tanto nos desprezam quando nos lançamos, com redobrado ardor, na defesa dos odiados, só lhes peço que reflitam, vençam a cegueira dos preconceitos e percebam que o verdadeiro cliente do advogado criminal é a liberdade humana, inclusive a deles que não nos compreendem e nos hostilizam, se num desgraçado dia precisarem de nós, para livrarem-se das teias da fatalidade.”
Espero que a OAB de Minas, bem como a OAB nacional lute ao lado do advogado e para a sociedade como fez sem temor nos anos de chumbo da ditadura militar, somente assim teremos o que comemorar no próximo dia 11 de agosto.
Belo Horizonte, 22 de novembro de 2011.
Leonardo Isaac Yarochewsky
Advogado Criminalista e Professor de Direito Penal da PUC-Minas

sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Crime Militar de aplicação da LEP

Fonte: Informativo de Jurisprudência do STJ nº 487
PROGRESSÃO. REGIME. CUMPRIMENTO. PENA. ESTABELECIMENTO MILITAR.
A Turma concedeu a ordem para determinar o restabelecimento da decisão de primeiro grau que deferiu a progressão de regime prisional ao paciente condenado pelo crime previsto no art. 310, caput, do Código Penal Militar (CPM) e recolhido em estabelecimento militar. O Min. Relator, acompanhando o entendimento do STF no julgamento do HC 104.174-RJ (DJe 18/5/2011), acolheu a aplicação subsidiária da Lei de Execuções Penais (LEP) nos processos de execução referentes a militares em cumprimento de pena nos presídios militares diante da lacuna da lei castrense quanto à citada matéria. Observou, ainda, que o cumprimento da pena privativa de liberdade no regime integralmente fechado em estabelecimento militar contraria não só o texto constitucional mas também todos os postulados infraconstitucionais atrelados ao princípio da individualização da pena, caracterizando, assim, evidente constrangimento ilegal suportado pelo paciente a ser sanado no writ. HC 215.765-RS, Rel. Min. Gilson Dipp, julgado em 8/11/2011

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Inoponibilidade do sigilo ao Defensor constituído - MC-Rcl 12.810 - STF

MED. CAUT. EM RECLAMAÇÃO 12.810 BAHIA
RELATOR : MIN. CELSO DE MELLO
RECLTE.(S) : SANDRA OLIVEIRA DA CRUZ
ADV.(A/S) : RODRIGO CARMONA TORRES E OUTRO(A/S)
RECLDO.(A/S) : JUÍZA DE DIREITO DA VARA DE TÓXICOS E
ACIDENTES DE VEÍCULOS DA COMARCA DE FEIRA DE SANTANA
EMENTA: RECLAMAÇÃO. DESRESPEITO AO ENUNCIADO CONSTANTE DA SÚMULA VINCULANTE Nº 14/STF. PERSECUÇÃO PENAL AINDA NA FASE DE INVESTIGAÇÃO POLICIAL. REGIME DE SIGILO. INOPONIBILIDADE AO ADVOGADO CONSTITUÍDO PELO INDICIADO OU PELO RÉU. DIREITO DE DEFESA. COMPREENSÃO GLOBAL DA FUNÇÃO DEFENSIVA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRERROGATIVA PROFISSIONAL DO ADVOGADO (LEI Nº 8.906/94, ART. 7º, INCISOS XIII E XIV). CONSEQÜENTE ACESSO AOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS JÁ DOCUMENTADOS, PRODUZIDOS E FORMALMENTE INCORPORADOS AOS AUTOS DA PERSECUÇÃO PENAL (INQUÉRITO POLICIAL OU PROCESSO JUDICIAL) OU A ESTES REGULARMENTE APENSADOS. POSTULADO DA COMUNHÃO OU DA AQUISIÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES (STF). DOUTRINA. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.
- O sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado regularmente constituído pelo indiciado (ou pelo réu), o direito de pleno acesso aos autos de persecução penal, mesmo que sujeita, em juízo ou fora dele, a regime de sigilo (necessariamente excepcional), limitando-se, no entanto, tal prerrogativa jurídica, às provas já produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas, conseqüentemente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentadas no próprio inquérito ou processo judicial. Precedentes. Doutrina.
DECISÃO: Trata-se de reclamação, com pedido de medida liminar, ajuizada contra ato emanado da MMª. Juíza de Direito da Vara de Tóxicos e Acidentes de Veículos da comarca de Feira de Santana/BA. Sustenta-se, na presente causa, que o ato reclamado em questão teria transgredido o enunciado da Súmula Vinculante nº 14, que possui o seguinte teor: “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao exercício do direito de defesa.” (grifei)
Busca-se, em síntese, na presente sede processual, o acesso da parte ora reclamante aos autos do procedimento penal nº 0014669-17.2011.805.0080, ainda em fase de investigação policial. Sendo esse o contexto, passo a apreciar o pedido de medida liminar.
E, ao fazê-lo, observo que os elementos produzidos na presente sede reclamatória parecem evidenciar a ocorrência de transgressão ao enunciado da Súmula Vinculante nº 14/STF, revelando-se suficientes para justificar, na espécie, o acolhimento da pretensão cautelar deduzida pela parte ora reclamante.
Com efeito, e como tenho salientado em muitas decisões proferidas no Supremo Tribunal Federal, o presente caso põe em evidência, uma vez mais, situação impregnada de alto relevo jurídico-constitucional, consideradas as graves implicações que resultam de injustas restrições impostas ao exercício, em plenitude, do direito de defesa e à prática, pelo Advogado, das prerrogativas profissionais que lhe são inerentes (Lei nº 8.906/94, art. 7º, incisos XIII e XIV). O Estatuto da Advocacia - ao dispor sobre o acesso do Advogado aos procedimentos estatais, inclusive àqueles que tramitem em regime de sigilo (hipótese em que se lhe exigirá a exibição do pertinente instrumento de mandato) – assegura-lhe, como típica prerrogativa de ordem profissional, o direito de examinar os autos, sempre em benefício de seu constituinte, e em ordem a viabilizar, quanto a este, o exercício do direito de conhecer os dados probatórios já formalmente produzidos no âmbito da investigação penal, para que se possibilite a prática de direitos básicos de que também é titular aquele contra quem foi instaurada, pelo Poder Público, determinada persecução criminal. Nem se diga, por absolutamente inaceitável, considerada a própria declaração constitucional de direitos, que a pessoa sob persecução penal (em juízo ou fora dele) mostrar-se-ia destituída de direitos e garantias. Esta Suprema Corte jamais poderia legitimar tal entendimento, pois a razão de ser do sistema de liberdades públicas vincula-se, em sua vocação protetiva, a amparar o cidadão contra eventuais excessos, abusos ou arbitrariedades emanados do aparelho estatal. Não custa advertir, como já tive o ensejo de acentuar em decisão proferida no âmbito desta Suprema Corte (MS 23.576/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO), que o respeito aos valores e princípios sobre os quais se estrutura, constitucionalmente, a organização do Estado Democrático de Direito, longe de comprometer a eficácia das investigações penais, configura fator de irrecusável legitimação de todas as ações lícitas desenvolvidas pela Polícia Judiciária, pelo Ministério Público ou pelo próprio Poder Judiciário. A pessoa contra quem se instaurou persecução penal – não importa se em juízo ou fora dele - não se despoja, mesmo que se cuide de simples indiciado, de sua condição de sujeito de determinados direitos e de senhor de garantias indisponíveis, cujo desrespeito só põe em evidência a censurável (e inaceitável) face arbitrária do Estado, a quem não se revela lícito desconhecer que os poderes de que dispõe devem conformar-se, necessariamente, ao que prescreve o ordenamento positivo da República. Cabe relembrar, no ponto, por necessário, a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Federal em torno da matéria pertinente à posição jurídica que o indiciado – e, com maior razão, o próprio réu - ostenta em nosso sistema normativo, e que lhe reconhece direitos e garantias inteiramente oponíveis ao poder do Estado, por parte daquele que sofre a persecução penal:
“INQUÉRITO POLICIAL - UNILATERALIDADE - A SITUAÇÃO JURÍDICA DO INDICIADO.
- O inquérito policial, que constitui instrumento de investigação penal, qualifica-se como procedimento administrativo destinado a subsidiar a atuação persecutória do Ministério Público, que é - enquanto ‘dominus litis’ - o verdadeiro destinatário das diligências executadas pela Polícia Judiciária. A unilateralidade das investigações preparatórias da ação penal não autoriza a Polícia Judiciária a desrespeitar as garantias jurídicas que assistem ao indiciado, que não mais pode ser considerado mero objeto de investigações. O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias, legais e constitucionais, cuja inobservância, pelos agentes do Estado, além de eventualmente induzir-lhes a responsabilidade penal por abuso de poder, pode gerar a absoluta desvalia das provas ilicitamente obtidas no curso da investigação policial.” (RTJ 168/896-897, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Esse entendimento - que reflete a própria jurisprudência do Supremo Tribunal Federal construída sob a égide da vigente Constituição - encontra apoio na lição de autores eminentes, que, não desconhecendo que o exercício do poder não autoriza a prática do arbítrio, enfatizam que, mesmo em procedimentos inquisitivos instaurados no plano da investigação policial, há direitos titularizados pelo indiciado, que simplesmente não podem ser ignorados pelo Estado.
Cabe referir, nesse sentido, o magistério de FAUZI HASSAN CHOUKE (“Garantias Constitucionais na Investigação Criminal”, p. 74, item n. 4.2, 1995, RT), de ADA PELLEGRINI GRINOVER (“A Polícia Civil
e as Garantias Constitucionais de Liberdade”, “in” “A Polícia à Luz do Direito”, p. 17, 1991, RT), de ROGÉRIO LAURIA TUCCI (“Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro”, p. 383, 1993,
Saraiva), de ROBERTO MAURÍCIO GENOFRE (“O Indiciado: de Objeto de Investigações a Sujeito de Direitos”, “in” “Justiça e Democracia”, vol. 1/181, item n. 4, 1996, RT), de PAULO FERNANDO SILVEIRA (“Devido Processo Legal - Due Process of Law”, p. 101, 1996, Del Rey), de ROMEU DE ALMEIDA SALLES JUNIOR (“Inquérito Policial e Ação Penal”, p. 60/61, item n. 48, 7ª ed., 1998, Saraiva) e de LUIZ CARLOS ROCHA (“Investigação Policial - Teoria e Prática”, p. 109, item n. 2, 1998, Saraiva), dentre outros.
Impende destacar, de outro lado, precisamente em face da circunstância de o indiciado ser, ele próprio, sujeito de direitos, que os Advogados por ele regularmente constituídos (como sucede no caso) têm direito de acesso aos autos da investigação (ou do processo) penal, ainda que em tramitação sob regime de sigilo, considerada a essencialidade do direito de defesa, que há de ser compreendido - enquanto prerrogativa indisponível assegurada pela Constituição da República - em perspectiva global e abrangente.
É certo, no entanto, em ocorrendo a hipótese excepcional de sigilo - e para que não se comprometa o sucesso das providências investigatórias em curso de execução (a significar, portanto, que se trata de providências ainda não formalmente incorporadas ao procedimento de investigação) -, que o acusado (e, até mesmo, o mero indiciado), por meio de Advogado por ele constituído, tem o direito de conhecer as informações “já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução das diligências em curso (...)” (RTJ 191/547-548, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei).
Vê-se, pois, que assiste, àquele sob persecução penal do Estado, o direito de acesso aos autos, por intermédio de seu Advogado, que poderá examiná-los, extrair cópias ou tomar apontamentos (Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIV), observando-se, quanto a tal prerrogativa, orientação consagrada em decisões proferidas por esta Suprema Corte (HC 86.059-MC/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 90.232/AM, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - Inq 1.867/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO – MS 23.836/DF, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, v.g.), mesmo quando a persecução estatal esteja sendo processada em caráter sigiloso, hipótese em que o Advogado do acusado, desde que por este constituído (como sucede na espécie), poderá ter acesso às peças que digam respeito à pessoa do seu cliente e que instrumentalizem prova já produzida nos autos, tal como esta Corte decidiu no julgamento do HC 82.354/PR, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE (RTJ 191/547-548):
“Do plexo de direitos dos quais é titular o indiciado - interessado primário no procedimento administrativo do
inquérito policial -, é corolário e instrumento a prerrogativa do advogado, de acesso aos autos respectivos,
explicitamente outorgada pelo Estatuto da Advocacia (L. 8906/94, art. 7º, XIV), da qual - ao contrário do que previu em hipóteses assemelhadas - não se excluíram os inquéritos que correm em sigilo: a irrestrita amplitude do preceito legal resolve em favor da prerrogativa do defensor o eventual conflito dela com os interesses do sigilo das investigações, de modo a fazer impertinente o apelo ao princípio da proporcionalidade. A oponibilidade ao defensor constituído esvaziaria uma garantia constitucional do indiciado (CF, art. 5º, LXIII), que lhe assegura, quando preso, e pelo menos lhe faculta, quando solto, a assistência técnica do advogado, que este não lhe poderá prestar se lhe é sonegado o acesso aos autos do inquérito sobre o objeto do qual haja o investigado de prestar declarações.
O direito do indiciado, por seu advogado, tem por objeto as informações já introduzidas nos autos do inquérito, não as relativas à decretação e às vicissitudes da execução de diligências em curso (cf. L. 9296, atinente às interceptações telefônicas, de possível extensão a outras diligências); dispõe, em conseqüência, a autoridade policial, de meios legítimos para obviar inconvenientes que o conhecimento pelo indiciado e seu defensor dos autos do inquérito policial possa acarretar à eficácia do procedimento investigatório.” (grifei)
Esse mesmo entendimento foi por mim reiterado, quando do julgamento de pleito cautelar que apreciei em decisão assim ementada:
“INQUÉRITO POLICIAL. REGIME DE SIGILO. INOPONIBILIDADE AO ADVOGADO CONSTITUÍDO PELO INDICIADO. DIREITO DE DEFESA. COMPREENSÃO GLOBAL DA FUNÇÃO DEFENSIVA. GARANTIA CONSTITUCIONAL. PRERROGATIVA PROFISSIONAL DO ADVOGADO (LEI Nº 8.906/94, ART. 7º, INCISOS XIII E XIV). OS ESTATUTOS DO PODER NÃO PODEM PRIVILEGIAR O MISTÉRIO NEM COMPROMETER, PELA UTILIZAÇÃO DO REGIME DE SIGILO, O EXERCÍCIO DE DIREITOS E GARANTIAS FUNDAMENTAIS POR PARTE DAQUELE QUE SOFRE INVESTIGAÇÃO PENAL. CONSEQÜENTE ACESSO AOS ELEMENTOS PROBATÓRIOS JÁ DOCUMENTADOS, PRODUZIDOS E FORMALMENTE INCORPORADOS AOS AUTOS DA INVESTIGAÇÃO PENAL. POSTULADO DA COMUNHÃO OU DA AQUISIÇÃO DA PROVA. PRECEDENTES (STF). DOUTRINA. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.
- O indiciado é sujeito de direitos e dispõe de garantias plenamente oponíveis ao poder do Estado (RTJ 168/896-897). A unilateralidade da investigação penal não autoriza que se desrespeitem as garantias básicas de que se acha investido, mesmo na fase pré-processual, aquele que sofre, por parte do Estado, atos de persecução criminal.
- O sistema normativo brasileiro assegura, ao Advogado regularmente constituído pelo indiciado (ou por aquele submetido a atos de persecução estatal), o direito de pleno acesso aos autos de investigação penal, mesmo que sujeita a regime de sigilo (necessariamente excepcional), limitando-se, no entanto, tal prerrogativa jurídica, às provas já produzidas e formalmente incorporadas ao procedimento investigatório, excluídas, conseqüentemente, as informações e providências investigatórias ainda em curso de execução e, por isso mesmo, não documentadas no próprio inquérito. Precedentes. Doutrina.” (HC 87.725-MC/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU 02/02/2007) Os eminentes Advogados ALBERTO ZACHARIAS TORON e ALEXANDRA LEBELSON SZAFIR, em valiosa obra - que versa, dentre outros temas, aquele ora em análise (“Prerrogativas Profissionais do Advogado”, p. 86, item n. 1, 2006, OAB Editora) -, examinaram, com precisão, a questão suscitada pela injusta recusa, ao Advogado investido de procuração (Lei nº 8.906/94, art. 7º, XIII), de acesso aos autos de inquérito policial ou de processo penal que tramitem, excepcionalmente, em regime de sigilo, valendo rememorar, a esse propósito, a seguinte passagem:
“No que concerne ao inquérito policial há regra clara no Estatuto do Advogado que assegura o direito aos
advogados de, mesmo sem procuração, ter acesso aos autos (art. 7º, inc. XIV) e que não é excepcionada pela disposição constante do § 1º do mesmo artigo que trata dos casos de sigilo. Certo é que o inciso XIV do art. 7º não fala a respeito dos inquéritos marcados pelo sigilo. Todavia, quando o sigilo tenha sido decretado, basta que se exija o instrumento procuratório para se viabilizar a vista dos autos do procedimento investigatório. Sim, porque inquéritos secretos não se compatibilizam com a garantia de o cidadão ter ao seu lado um profissional para assisti-lo, quer para permanecer calado, quer para não se auto-incriminar (CF, art. 5º, LXIII). Portanto, a presença do advogado no inquérito e, sobretudo, no flagrante não é de caráter afetivo ou emocional. Tem caráter profissional, efetivo, e não meramente simbólico. Isso, porém, só ocorrerá se o advogado puder ter acesso aos autos. Advogados cegos, ‘blind lawyers’, poderão, quem sabe, confortar afetivamente seus assistidos, mas, juridicamente, prestar-se-ão, unicamente, a legitimar tudo o que no
inquérito se fizer contra o indiciado.” (grifei)
Cumpre referir, ainda, que a colenda Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o HC 88.190/RJ, Rel. Min. CEZAR PELUSO, reafirmou o entendimento anteriormente adotado por esta Suprema Corte (HC 86.059-MC/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 87.827/RJ, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE), em julgamento que restou consubstanciado em acórdão assim ementado:
“ADVOGADO. Investigação sigilosa do Ministério Público Federal. Sigilo inoponível ao patrono do suspeito ou investigado. Intervenção nos autos. Elementos documentados. Acesso amplo. Assistência técnica ao cliente ou constituinte. Prerrogativa profissional garantida. Resguardo da eficácia das investigações em curso ou por fazer. Desnecessidade de constarem dos autos do procedimento investigatório. HC concedido. Inteligência do art. 5°, LXIII, da CF, art. 20 do CPP, art. 7º, XIV, da Lei nº 8.906/94, art. 16 do CPPM, e art. 26 da Lei nº 6.368/76. Precedentes. É direito do advogado, suscetível de ser garantido por habeas corpus, o de, em tutela ou no interesse do cliente envolvido nas investigações, ter acesso amplo aos elementos que, já documentados em procedimento investigatório realizado por órgão com competência de polícia judiciária ou por órgão do Ministério Público, digam respeito ao constituinte.” (grifei)
Cabe assinalar, neste ponto, um outro aspecto relevante do tema ora em análise, considerados os elementos probatórios alegadamente já produzidos nos autos da persecução penal e, portanto, a estes já formalmente incorporados, como sucede, no caso ora em exame, com os autos referentes ao pedido de interceptação de
comunicações telefônicas sob nº 0008464-69.2011.805.0080. Refiro-me ao postulado da comunhão da prova, cuja eficácia projeta-se e incide sobre todos os dados informativos, que, concernentes à “informatio
delicti”, compõem o acervo probatório coligido pelas autoridades e agentes estatais.
Esse postulado assume inegável importância no plano das garantias de ordem jurídica reconhecidas ao investigado e ao réu, pois, como se sabe, o princípio da comunhão (ou da aquisição) da prova assegura, ao que sofre persecução penal – ainda que submetida esta ao regime de sigilo -, o direito de conhecer os elementos de informação já existentes nos autos e cujo teor possa ser, eventualmente, de seu interesse, quer para efeito de exercício da auto-defesa, quer para desempenho da defesa técnica.
É que a prova penal, uma vez regularmente introduzida no procedimento persecutório, não pertence a ninguém, mas integra os autos do respectivo inquérito ou processo, constituindo, desse modo, acervo plenamente acessível a todos quantos sofram, em referido procedimento sigiloso, atos de persecução penal por parte do Estado.
Essa compreensão do tema – cabe ressaltar - é revelada por autorizado magistério doutrinário (ADALBERTO JOSÉ Q. T. DE CAMARGO ARANHA, “Da Prova no Processo Penal”, p. 31, item n. 3, 3ª ed., 1994, Saraiva; DANIEL AMORIM ASSUMPÇÃO NEVES, “O Princípio da Comunhão da Prova”, “in” Revista Dialética de Direito Processual (RDPP), vol. 31/19-33, 2005; FERNANDO CAPEZ, “Curso de Processo Penal”, p. 259, item n. 17.7, 7ª ed., 2001, Saraiva; MARCELLUS POLASTRI LIMA, “A Prova Penal”, p. 31, item n. 2, 2ª ed., 2003, Lumen Juris, v.g.), valendo referir, por extremamente relevante,
a lição expendida por JOSÉ CARLOS BARBOSA MOREIRA (“O Juiz e a Prova”, “in” Revista de Processo, nº 35, Ano IX, abril/junho de 1984, p. 178/184):
“E basta pensar no seguinte: se a prova for feita, pouco importa a sua origem. (...). A prova do fato não aumenta nem diminui de valor segundo haja sido trazida por aquele a quem cabia o ônus, ou pelo adversário. A isso se chama o ‘princípio da comunhão da prova’: a prova, depois de feita, é comum, não pertence a quem a faz, pertence ao processo; pouco importa sua fonte, pouco importa sua proveniência. (...).” (grifei)
Cumpre rememorar, ainda, ante a sua inteira pertinência, o magistério de PAULO RANGEL (“Direito Processual Penal”, p. 411/412, item n. 7.5.1, 8ª ed., 2004, Lumen Juris):
“A palavra comunhão vem do latim ‘communione’, que significa ato ou efeito de comungar, participação em comum em crenças, idéias ou interesses. Referindo-se à prova, portanto, quer-se dizer que a mesma, uma vez no processo, pertence a todos os sujeitos processuais (partes e juiz), não obstante ter sido levada apenas por um deles. (...). O princípio da comunhão da prova é um consectário lógico dos princípios da verdade real e da igualdade das partes na relação jurídico processual, pois as partes, a fim de estabelecer a verdade histórica nos autos do processo, não abrem mão do meio de prova levado para os autos.
(...) Por conclusão, os princípios da verdade real e da igualdade das partes na relação jurídico-processual fazem com que as provas carreadas para os autos pertençam a todos os sujeitos processuais, ou seja, dão origem ao princípio da comunhão das provas.” (grifei)
É por tal razão que se impõe assegurar, aos Advogados, ora reclamantes, o acesso a toda informação já produzida e formalmente incorporada aos autos da persecução penal em causa, mesmo porque o conhecimento do acervo probatório pode revestir-se de particular relevo para a própria elaboração da defesa técnica por parte dos ora reclamantes.
É fundamental, no entanto, para o efeito referido nesta decisão, que os elementos probatórios já tenham sido formalmente produzidos nos autos da persecução penal. O que não se revela constitucionalmente lícito, segundo entendo, é impedir que a indiciada tenha pleno acesso aos dados probatórios, que, já documentados nos autos (porque a estes formalmente incorporados ou a eles regularmente apensados), veiculam informações que possam revelar-se úteis ao conhecimento da verdade real e à condução da defesa da pessoa investigada (como no caso) ou processada pelo Estado, ainda que o procedimento de persecução penal esteja submetido a regime de sigilo.
Sendo assim, em face das razões expostas, e em juízo de estrita delibação, defiro o pedido de medida cautelar, em ordem a garantir, à parte reclamante, o direito de acesso aos autos do procedimento penal nº 0014669-17-2011.805.0080 (e aos documentos a eles já incorporados), em trâmite perante a Vara de Tóxicos e Acidentes de Veículos da comarca de Feira de Santana/BA.
Observo, por necessário, que este provimento jurisdicional assegura, à parte ora reclamante, o direito de acesso, exclusivamente, às informações, aos documentos, às decisões e às provas penais já formalmente introduzidos nos autos do procedimento investigatório em questão ou a estes já apensados, caso se ache concluído o respectivo procedimento probatório, como sucede com os autos referentes ao pedido de interceptação de comunicações telefônicas sob nº 0008464-69.2011.805.0080.
Comunique-se, com urgência, transmitindo-se cópia da presente decisão, para cumprimento integral, à MMª. Juíza de Direito da Vara de Tóxicos e Acidentes de Veículos da comarca de Feira de Santana/BA.
2. Corrija-se a autuação, para que desta constem, como reclamantes, Rodrigo Andrés Carmona Torres e João Vieira Neto, excluindo-se a referência feita a Sandra Oliveira da Cruz.
Publique-se.
Brasília, 28 de outubro de 2011.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Inconstitucionalidade do artigo 273, § 1º, do CP - Sentença de Ali Mazloum

1.ª Subseção Judiciária do Estado de São Paulo
7. ª Vara Criminal
autos da AÇÃO PENAL n.º 0014385-34.2008.403.6181
- dia 5 de outubro de 2011 -
TERMO DE AUDIÊNCIA
AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO

S E N T E N Ç A (TIPO D)
Aos cinco dias do mês de outubro do ano de dois mil e onze, às 14h22min, na cidade de São Paulo, no Fórum Criminal Federal, na sala de audiências da 7.ª Vara, presente o MM. Juiz Federal Dr. ALI MAZLOUM, comigo técnico judiciário, ao final nomeado, foi feito o pregão da audiência, referente aos autos em epígrafe. Aberta a audiência e apregoadas as partes, estavam presentes, a Procuradora da República Dra. MELISSA GARCIA BLAGITZ DE ABREU E SILVA, a acusada JSX, acompanhada do Defensor Público Federal, Dr. GUSTAVO HENRIQUE ARMBRUST VIRGINELLI, MATRICULA 362. Passou-se o interrogatório da acusada, por meio de gravação audiovisual. Após, pelo MM. Juiz foi dito: “Não havendo mais provas a serem produzidas, dou por encerrada a instrução. Nos termos do artigo 402 do Código de Processo Penal, indagado as partes para requererem diligências cuja necessidade se origine de circunstâncias ou fatos apurados na instrução, nada foi requerido. Assim, determino a abertura dos trabalhos de Debates e Julgamento da presente causa”. Em seguida, foi dada a palavra à ilustre Procuradora da República, e logo após ao nobre Defensor Público Federal, em debates orais, que se manifestaram por meio de gravação audiovisual. Logo após, o MM. Juiz passou a prolatar a sentença, nos seguintes termos: “I – RELATÓRIO. Cuida-se de ação penal em que o Ministério Público Federal ofereceu denúncia em face de JSX, pela prática, em tese, do crime previsto no artigo 273, § 1.º-B, inciso I, do Código Penal (duas vezes), pois, segundo a denúncia, a acusada suspeitando estar grávida, procedeu a buscas na Internet de medicamentos abortivos e, em tratativas com a organização estrangeira WOMEN ON WEB, solicitou-lhe o envio de medicamentos que produzissem este efeito. O primeiro pedido foi feito em 08.05.2008, tendo como objeto postal n.º RR017036596IN, e o segundo pedido feito a 03.06.2008, tendo como objeto postal n.º RR018510905IN. Em ambas as oportunidades foram remetidos 6 comprimidos Misoprost-200 e 1 comprimido de MTPill, em cada uma das remessas. Narra a inicial que a referida organização, de fato, remeteu do exterior (Índia) o Misoprost-200 (misoprostol) e MTPill (mifepristona), acompanhado de material para teste de gravidez, ambos destinados à acusada (fls. 78/80). A denúncia foi recebida na data de 13.11.2009 (folha 81). Em 5 de novembro de 2010, o Ministério Público Federal promoveu o aditamento da denúncia (fls. 160/162), para inclusão de novos fatos, sendo recebido o aditamento em 5 de abril de 2011 (fls. 177/178). Procedeu-se a citação pessoal da acusada (fl. 188) e apresentação de resposta à acusação (fls. 191/197). Nesta data, a acusada foi interrogada. Em debates orais, o Ministério Público Federal requereu a condenação da acusada, ao passo que a defesa pugnou pela absolvição. Em síntese, as teses: Pelo MPF sustentou-se a condenação ante a comprovação da materialidade delitiva pelos laudos periciais. A autoria também estaria comprovada ante o quanto alegado pela acusada, bem como pelo teor dos e-mails trocados entre ela e a organização fornecedora dos produtos. Reconhecimento da tentativa em ambas as oportunidades deliquenciais. Pela defesa foi sustentada a atipicidade da conduta, pois não houve a importação para fins comerciais; erro de proibição, ante o desconhecimento da acusada provocada pelas informações fornecidas pela organização fornecedora, bem como informações da ANVISA fornecidas à 8.ª Vara local em caso semelhante; incidência do princípio da insignificância ante a quantidade de comprimidos em analogia com a lei de drogas; absorção do delito por ser o crime meio para o aborto; não aplicação da continuidade delitiva ante a existência de falha na comunicação entre a acusada e a organização fornecedora, bem como em razão da interceptação pela alfândega da primeira remessa, o que induziu a erro a acusada. É o relato do essencial. DECIDO. II – FUNDAMENTAÇÃO. Registro que o feito encontra-se formalmente em ordem, com as partes legítimas e bem representadas, inexistindo vícios ou nulidades a serem sanados. Assim, não havendo questões preliminares apresentadas pelas partes, passo ao exame do mérito. Entendo que a denúncia deva ser julgada improcedente, ante a manifesta inconstitucionalidade do preceito secundário do tipo penal imputado. A Lei 9.695/98 classificou os crimes do artigo 273 do Código Penal como hediondos, incluindo-os no rol do artigo 1º da Lei 8.072/90. Por se tratar de crime que atenta contra a saúde pública, envolvendo perigo para a coletividade, o legislador estabeleceu no preceito secundário da aludida norma pena exacerbada - reclusão de 10 a 15 anos (alteração legislativa determinada pela Lei 9.677/98). O delito de falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a
fins terapêuticos ou medicinais, descrito no artigo 273 e parágrafos do CP, insere-se dentre os crimes de perigo abstrato, plurissubsistente e permanente. Segundo o magistério de Cezar Roberto Bitencourt, “os núcleos do tipo previstos no caput são os verbos falsificar (dar ou referir como verdadeiro o que não é); corromper (estragar, infectar); adulterar (contrafazer, deturpar) e alterar (modificar, transformar). Nas mesmas penas incorrerá quem importar (fazer vir do exterior), vender (comercializar, negociar, alienar de forma onerosa), expor à venda (pôr à vista, mostrar, apresentar, oferecer, exibir para a venda), tiver em depósito para vender (colocar em lugar seguro, conservar, mantiver para si mesmo), distribuir (dar, repartir) ou entregar a consumo (repassar) o produto falsificado, corrompido, adulterado ou alterado” (in “Código Penal Comentado”, São Paulo: Saraiva, 4ª edição, 2007, pág. 1004). Assinale-se, portanto, que o tipo penal, em qualquer de suas figuras, exige, para a sua configuração, que o objeto material do crime (produto terapêutico ou medicinal) seja falsificado, corrompido, adulterado ou alterado. A denúncia, entretanto, não descreve uma única linha sobre eventual ocorrência de tais elementares, sendo certo que o laudo nela indicado limita-se à constatação da origem ou procedência dos produtos apreendidos. Júlio Fabbrini Mirabete assinala que “o dolo, tanto nas condutas previstas nos §§ 1º e 1º-B, exige que o agente, além da vontade de praticar a ação, tenha ciência da falsificação, corrupção, adulteração ou alteração do produto incriminado ou de que esteja ele em uma das situações previstas no último parágrafo citado” (in “Manual de Direito Penal”, São Paulo: Atlas, vol. III, 2004, 19ª ed., p. 159). Ressalte-se que as figuras descritas no caput, no § 1º, e no § 1º-A do art. 273, exigem, sem dúvida, exame pericial que ateste a falsificação, corrupção, adulteração ou alteração do produto, fato inocorrente no caso, não estando, inclusive, tal circunstância descrita na denúncia. Há quem entenda, porém, que o § 1º-B do artigo 273 não requer a existência dos supracitados verbos nucleares ou derivação (falsificação, corrupção, adulteração e alteração). Vale dizer que, para a concretização dessa espécie delitiva, bastaria ao agente importar, vender, expor à venda ou ter em depósito produto terapêutico ou medicinal (verdadeiro, sem adulteração) em qualquer das condições indicados nos incisos deste preceptivo. Tal fato conduziria a absurdos. O homicida se sujeitaria a pena mínima de 6 anos de reclusão, ao passo que o agente que comercializasse algum detergente sem registro no órgão de vigilância receberia pena mínima de 10 anos de reclusão. Não é por outro motivo que o Egrégio Tribunal de Justiça de São Paulo, buscando traçar limites à incidência do crime em questão, tem decidido no seguinte sentido: “O simples ter em depósito, ainda que para fins de distribuição ou venda, de medicamentos sem registro e adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente, não basta, à luz do disposto pelo parágrafo 1º-B, incisos I e VI, do artigo 273 do Código Penal, à configuração do crime, exigindo-se para tanto, que o produto tenha sido falsificado, corrompido, adulterado ou alterado” (TJ-SP Apelação criminal 1.029.020.3/6-00 – 11ª Câmara B do 6º Grupo da Seção Criminal – Rel. Leandro Bittencourt - dj 18.05.2007). FALSIFICAÇÃO DE SUBSTÂNCIA MEDICINAL – Não caracterização – Laudo atestou que o referido medicamento apreendido não estava falsificado, não se encontrava corrompido, adulterado ou alterado – Simples posse que não caracteriza o crime do artigo 273, parágrafo 1º-B, incisos V e VI, do Código Penal – condenação afastada – Recurso provido. A simples posse, ainda que para fins de distribuição, de medicamentos de procedência ignorada e adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente, não basta, à luz do disposto pelo parágrafo 1º do artigo 273 do Código Penal, à configuração do crime, exigindo-se para tanto, que o produto tenha sido falsificado, adulterado ou alterado” (TJSP – Ap. Criminal com Revisão n. 471.211-3/5 – Tatuí – 5ª Câmara Criminal – Rel. Donegá Morandini – J. 30.09.2004). Registre-se, ainda, como abono à manifesta violação ao princípio da proporcionalidade da pena, o seguinte fato: caso a acusada estivesse realmente grávida e viesse a ingerir a substância importada, estaria sujeita à pena mínima de 1 ano de detenção, pela prática, em tese, do crime de aborto. Além disso, caso ainda decidisse matar o responsável pela gravidez, estaria sujeita à pena mínima de 6 anos de reclusão pela prática, em tese, do crime do artigo 121 do Código Penal. Somadas as duas penas, a acusada estaria sujeita à 7 anos de prisão, ao passo que para o crime do artigo 273 a pena mínima seria de 10 anos de prisão. Isso demonstra o evidente absurdo da pena cominada ao crime imputado, revelando que a destruição hipotética de duas vidas valeria menos que a importação de um comprimido de CYTOTEC. O princípio da proporcionalidade deve interceder em favor da vida, ainda que em detrimento de interesses de grandes laboratórios. É manifesta a inconstitucionalidade do preceito secundário do artigo 273 do Código Penal, recusando-se este Juízo, portanto, a cogitar à aplicação de tão grave reprimenda. Não bastasse tudo isso, na pior das hipóteses, caso se queira entender constitucional a referida norma, deve-se comungar do entendimento da d. Defensoria Pública da União, no sentido de que o crime em apreço tem por fim a tutela da saúde pública e visa à repressão da importação de medicamentos proibidos para fins comerciais. No caso dos autos, a acusada, acreditando que estava grávida, buscou o medicamento para fins abortivos. Tratar-se-ia de autoaborto. É certo, porém, que a acusada obrou em delito putativo por erro de tipo, pois não estava grávida, conforme relatou nesta audiência. Neste caso, não seria despropositado concluir que o erro de tipo contaminaria à ação precedente de importação do medicamento abortivo. Por qualquer ângulo que se queira examinar a questão, a absolvição é de rigor. III – DISPOSITIVO - Diante disso, com base nos motivos expendidos, e o mais que dos autos consta, JULGO IMPROCEDENTE a ação penal para ABSOLVER JSX, qualificada nos autos, do crime que lhe foi imputado na denúncia, fazendo-o com fundamento no inciso III do artigo 386 do Código de Processo Penal. Após o trânsito em julgado, e depois de feitas as necessárias comunicações e anotações (inclusive remessa ao SEDI para alteração da situação processual da acusada), ARQUIVEM-SE OS AUTOS. Custas ex lege. P.R.C.. Saem os presentes intimados nesta audiência. Estando os prazos suspensos com relação ao Ministério Público Federal em razão da mudança de sede, defiro o pedido de vista no primeiro dia útil após a suspensão para análise de eventual recurso”. Termo encerrado às 20:27min. Nada mais, lido e achado conforme, vai devidamente assinado. Eu, ____,(Marcelo Silvestre Salvino), Técnico Judiciário, RF 5713, digitei.
MM. JUIZ:
MPF:
DPU:
ACUSADA:

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

Repercussão Geral - Cumprimento de pena em regime menos gravoso, face à inexistência de estabelecimento adequado

Fonte: Info 637 do STF
REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 641.320-RS
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
Constitucional. 2. Direito Processual Penal. 3. Execução Penal. 4. Cumprimento de pena em regime menos gravoso, diante da impossibilidade de o Estado fornecer vagas para o cumprimento no regime originalmente estabelecido na condenação penal. 5. Violação dos artigos 1º, III, e 5º, II, XLVI e LXV, ambos da Constituição Federal. 6. Repercussão geral reconhecida.

Reprecussão Geral - Manutenção da prerrogativa de foro para magistrados aposentados

REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 642.553-DF
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
Constitucional. 2. Direito Processual Penal. 3. Competência. 4. Manutenção da prerrogativa de foro para magistrados que não mais exercem o cargo em razão de aposentadoria. 5. Violação dos artigos 5º, LIII, LIV e LV; 93, IX; 95, I; e 105, I, ‘a’, da  Constituição Federal. 6. Repercussão geral reconhecida. 

Desclassificação de homicídio doloso para culposo na direção de veículo automotor - HC-107801 - STF

Fonte: Info 639 STF
Desclassificação de homicídio doloso para culposo na direção de veículo automotor - 2
Em conclusão, a 1ª Turma deferiu, por maioria, habeas corpus para desclassificar o delito de homicídio doloso para culposo na direção de veículo automotor, descrito na revogada redação do art. 302, parágrafo único, V, da Lei 9.503/97 - CTB (“Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor: ... Parágrafo único. No homicídio culposo cometido na direção de veículo automotor, a pena é aumentada de um terço à metade, se o agente: ... V - estiver sob a influência de álcool ou substância tóxica ou entorpecente de efeitos análogos”) — v. Informativo 629. Inicialmente, ressaltou-se que o exame da questão não demandaria revolvimento do conjunto fático-probatório, mas apenas revaloração jurídica do que descrito nas instâncias inferiores. Em seguida, consignou-se que a aplicação da teoria da actio libera in causa somente seria admissível para justificar a imputação de crime doloso no caso de embriaguez preordenada quando ficasse comprovado que o agente teria se inebriado com o intuito de praticar o ilícito ou assumir o risco de produzi-lo, o que não ocorrera na espécie dos autos. Asseverou-se que, nas hipóteses em que o fato considerado doloso decorresse de mera presunção em virtude de embriaguez alcoólica eventual, prevaleceria a capitulação do homicídio como culposo na direção de veículo automotor em detrimento daquela descrita no art. 121 do CP. O Min. Marco Aurélio acrescentou que haveria norma especial a reger a matéria, com a peculiaridade da causa de aumento decorrente da embriaguez ao volante. Sublinhou que seria contraditória a prática generalizada de se vislumbrar o dolo eventual em qualquer desastre de veículo automotor com o resultado morte, porquanto se compreenderia que o autor do crime também submeteria a própria vida a risco. Vencida a Min. Cármen Lúcia, relatora, que denegava a ordem por reputar que a análise de ocorrência de culpa consciente ou de dolo eventual em processos de competência do tribunal do júri demandaria aprofundado revolvimento da prova produzida no âmbito da ação penal.
HC 107801/SP, rel. orig. Min. Cármen Lúcia, red. p/ o acórdão Min. Luiz Fux, 6.9.2011. (HC-107801)

Residência do réu e direito de recorrer em liberdade

Fonte: Info 640 do STF
Residência do réu e direito de recorrer em liberdade
O fato de o réu não residir no distrito da culpa não constitui, por si só, motivo bastante para justificar a denegação do direito de recorrer em liberdade. Com base nesse entendimento, a 2ª Turma proveu recurso ordinário em habeas corpus para garantir aos recorrentes, se por outro motivo não estiverem presos, o direito de permanecerem em liberdade, até o eventual trânsito em julgado da sentença condenatória. No caso, os pacientes foram condenados a 3 anos de reclusão pelo crime de estelionato, sem direito de recorrer em liberdade, sob o fundamento de preservação da ordem pública e da fiel execução da lei penal, especialmente, pelo fato de terem permanecido presos durante a instrução criminal e do receio de que pudessem evadir-se por não possuírem residência na comarca. Consignou-se que constituiria discriminação de ordem regional, vedada pelo art. 3º, IV, da CF, considerar o fato de a residência do réu não estar localizada no distrito da culpa. Ressaltou-se não haver motivo idôneo para a manutenção da custódia cautelar. O Min. Ricardo Lewandowski acrescentou que os recorrentes já teriam direito à progressão para o regime aberto, uma vez que condenados à pena de 3 anos de reclusão no semi-aberto.
RHC 108588/DF, rel. Min. Celso de Mello, 13.9.2011. (RHC-108588)

Os delitos da Lei de Licitações são crimes de resultado.

Fonte: Info 640 dp sTF
Inexigibilidade de licitação e ausência de dolo - 1
O Plenário, por maioria, rejeitou denúncia ajuizada contra atual deputado federal, então prefeito à época dos fatos, além de outros acusados pela suposta prática, em concurso, do crime previsto no art. 89 da Lei 8.666/93 (“Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixar de observar as formalidades pertinentes à dispensa ou à inexigibilidade”). Constava da inicial acusatória que o parlamentar, o diretor e o secretário municipal de esportes e lazer teriam contratado bandas de música para as comemorações de carnaval na localidade, supostamente em desacordo com as hipóteses legais e sem o necessário procedimento administrativo disposto no art. 26 da mencionada lei. A acusação afirmava, também, que os grupos musicais foram contratados por empresas sem vínculo com o setor artístico; que a substituição de 2 bandas, após parecer da procuradoria local pela inexigibilidade da licitação, teria gerado um acréscimo de R$ 7 mil ao valor das contratações, a totalizar R$ 62 mil; e que existiriam processos de contratação identicamente numerados com a mesma data e com o mesmo objeto. No caso, a exordial fora aditada para consignar que o parlamentar, ao ratificar as conclusões da procuradoria do município sem observar as formalidades legais, teria se omitido no seu dever de agir.
Inq 2482/MG, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o acórdão, Min. Luiz Fux, 15.9.2011. (Inq-2482)

Inexigibilidade de licitação e ausência de dolo - 2
Prevaleceu o voto do Min. Luiz Fux, que assentou a falta de justa causa para o recebimento da denúncia, ante a ausência de elemento subjetivo do tipo. Destacou, de início, ser inverídica a assertiva de que o recebimento da peça acusatória, tendo em conta a prevalência da presunção de inocência, possibilitaria ao acusado melhores condições de comprovar a ausência de ilicitude. Em seguida, registrou que os delitos da Lei de Licitações não seriam crimes de mera conduta ou formais, mas sim de resultado, o qual ficaria afastado, na espécie, porque as bandas, efetivamente, prestaram serviço. Ao analisar o dolo, asseverou que a consulta sobre a possibilidade de fazer algo demonstraria a inexistência de vontade de praticar ilícito, de modo que aquele que consulta e recebe uma resposta de um órgão jurídico no sentido de que a licitação seria inexigível não teria manifestação voltada à prática de infração penal. Assinalou, ademais, que, na área musical e artística, as obrigações seriam firmadas em razão das qualidades pessoais do contratado, fundamento este para a inexigibilidade de licitação. O Min. Dias Toffoli frisou que a denúncia não descrevera em que consistiria a vantagem obtida com a não-realização do certame. Por sua vez, o Min. Gilmar Mendes apontou que, se não se tratar de intérpretes consagrados, a norma do art. 25, III, da Lei 8.666/93 sofreria uma relativização, uma localização. Por fim, os Ministros Celso de Mello e Cezar Peluso, Presidente, não vislumbraram a existência de fato típico. Aquele Ministro acrescentou que o mencionado aditamento não definira em que consistiria a relevância causal da omissão imputada ao parlamentar.
Inq 2482/MG, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o acórdão, Min. Luiz Fux, 15.9.2011. (Inq-2482)

Inexigibilidade de licitação e ausência de dolo - 3
Vencidos os Ministros Ayres Britto, relator, que recebia a denúncia em sua integralidade, e Marco Aurélio, que a acolhia apenas contra o então prefeito e determinava a remessa de cópias ao juízo de primeiro grau relativamente aos acusados que não possuíam prerrogativa de foro no STF. Aduzia, ainda, que não se teria contratado escolhendo banda única pelo valor artístico — quando presente a exclusividade para prestar os serviços —, porém 8 bandas mediante empresas intermediárias. O relator, ao seu turno, reputava que a peça acusatória atenderia as exigências legais e que presente conjunto probatório sinalizador da prática de condutas comissivas e omissivas para burlar a necessidade de licitação. Além disso, apontava que a exordial permitiria aos acusados o conhecimento dos fatos a eles atribuídos, com o exercício da ampla defesa.
Inq 2482/MG, rel. orig. Min. Ayres Britto, red. p/ o acórdão, Min. Luiz Fux, 15.9.2011. (Inq-2482)

terça-feira, 4 de outubro de 2011

Direito Processual Penal. Prisão preventiva. Excesso de prazo para oferecimento de denúncia. Princípio da razoabilidade.


Direito Processual Penal. Prisão preventiva. Excesso de prazo para oferecimento de denúncia. Princípio da razoabilidade.
“(...) São idênticos os pressupostos da prisão preventiva e os requisitos necessários ao oferecimento da denúncia (prova da existência do crime e indício suficiente da autoria). Essa identidade desautoriza o excesso de prazo na conclusão das investigações, quando se encontrar cautelarmente preso o investigado, uma vez que à mão do Ministério Público se encontram todos os elementos necessários para a elaboração de um juízo acusatório.A manutenção da prisão cautelar do paciente, sem a existência de uma acusação formalizada, por prazo além do estabelecido para a conclusão do inquérito policial, reclama motivação fundada na razoabilidade e proporcionalidade, o que não se enxerga na presente hipótese.As Resoluções 63/2009, do Conselho da Justiça Federal, e 22/2009, desta Corte Regional de Justiça, impõem o encaminhamento ao órgão do Poder Judiciário competente, dos autos de inquérito policial que tiverem sido iniciados por auto de prisão em flagrante ou em que tiver sido decretada prisão temporária ou prisão preventiva, na hipótese de eventual requerimento de prorrogação de prazo para a sua conclusão.Hipótese em que o Ministério Público Federal, através de cota dirigida ao Delegado de Polícia Federal, e sem a participação da autoridade judicial, dilatou em 12 dias o prazo para o encerramento das investigações e elaboração do relatório final.Existência de informações no sentido de que as diligências inicialmente requisitadas não foram suficientes à formação da opinio delictdo Ministério Público Federal, que requereu diligências complementares, prorrogando em mais 60 (sessenta) dias o prazo para a conclusão das investigações.Hipótese em que o paciente não cometeu crime com violência, nem possui histórico de crimes violentos. (...).” (TRF 5.ª R. – 2.ª T. – HC 0007530-93.2011.4.05.0000 – rel. Rubens de Mendonça Canuto – j. 14.06.2011 – public. 16.06.2011 – Cadastro IBBCRIM 2176)

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Direito Processual Penal. Denúncia inepta. Ausência da descrição das circunstâncias. Nulidade insanável.


Direito Processual Penal. Denúncia inepta. Ausência da descrição das circunstâncias. Nulidade insanável.
“(...) 1. Inepta é a denúncia que não descreve o fato criminoso com todas as suas circunstâncias, tal como exige o art. 41 do CPP. 2. Sendo atípica a hipótese denunciada, deve prevalecer o resultado absolutório, na medida em que defeso ao julgador valorar circunstâncias fáticas não descritas na denúncia – pena de dar esteio a mal disfarçada mutatio libelli em segundo grau. Deram provimento ao apelo defensivo (unânime). (...).” (TJRS – 5.ª Câm. Crim. –AP 70043050210 – rel. Amilton Bueno de Carvalho – j. 22.06.2011 – public.05.07.2011)

Execução Penal. Direito Processual Penal. Princípio da fungibilidade.STJ – 5.ª T. – HC200.104


Execução Penal. Direito Processual Penal. Princípio da fungibilidade.
“(...) 1. Apesar de ser o agravo o recurso próprio cabível contra decisão que resolve incidente em execução, não há óbice ao manejo do habeas corpus quando a análise da legalidade do ato coator prescindir do exame aprofundado de provas, como no caso, em que se faz necessário analisar apenas o preenchimento de requisitos objetivos. (...).” (STJ – 5.ª T. – HC200.104 – rel. Laurita Vaz – j. 21.06.2011 – public. 28.06.2011)

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

“Não creio que possa o MP colocar a estrela no peito e a arma na cintura e partir para investigações” Min. Marco Aurélio




Fonte: Matéria copiada do site do TSE - Notícias de 13/09/11

"Vista suspende debate sobre poder de investigação do MPE para apurar crimes eleitorais



Sessão do TSE. Brasilia/DF 13/09/2011 Foto:Nelson Jr./ASICS/TSE
Pedido de vista do ministro Marcelo Ribeiro, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), suspendeu, na noite desta terça-feira, a análise de um recurso que pretende discutir se o Ministério Público Eleitoral (MPE) tem atribuições para realizar investigação a fim de apurar crimes eleitorais.

No caso, o MPE instaurou um procedimento investigativo para apurar suposta prática de crime eleitoral por corrupção ativa e passiva do candidato a vereador Abdon Abdala Che Neto no município de Cairu, na Bahia. O Ministério Público alega que o Tribunal Regional da Bahia (TRE-BA), ao conceder o trancamento da ação penal, contrariou a Constituição Federal e o Código de Processo Penal no ponto em que definem as atribuições do Ministério Público.

O procurador-geral eleitoral, Roberto Gurgel, afirmou que, no caso, o MPE limitou-se a reunir provas convencionais, não caracterizando um procedimento investigatório. No entanto, disse que o entendimento da PGR é no sentido de que o MPE tem o poder de investigar. “É plena a legitimidade constitucional do poder de investigar do MP. Os organismos policiais não têm, no sistema jurídico brasileiro, o monopólio da competência penal investigatória”, afirmou.

“Não reconhecer o poder investigatório do Ministério Público significa amputar-lhe as suas atribuições em afronta ao texto da Constituição à sua missão. Significa podar de uma forma radical as suas atribuições e impedir que elas sejam adequadamente exercidas”, salientou.

Ao votar, a relatora, ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha disse que o TSE tem admitido procedimentos administrativos investigatórios pelo Ministério Público como suficientes para a apresentação de denúncia criminal, acompanhando jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

Lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) examina um processo com matéria relativa à competência do MP para executar procedimento investigatório e dar início a ação penal .  Ressaltou ainda, que em algumas decisões tomadas nas Turmas entendido que a denúncia pode ser fundamentada em peças obtidas pelo MP, sem a necessidade do prévio inquérito policial. Ao concluir seu voto, a ministra Cármen Lúcia determinou o prosseguimento da ação penal.

O ministro Marco Aurélio, no entanto, divergiu da relatora. Afirmou que a Constituição Federal diz no artigo 129, que cabe ao Ministério Público “promover privativamente a ação penal pública, na forma da lei”. “Não pode, o que tem a titularidade da ação penal, investigar e acusar”, ressaltou.

De acordo com o ministro, “cabe a ele requisitar, não implementar, diligências investigatórias e requisitar instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais”.

O ministro disse ainda que o artigo 144 da Constituição Federal prevê que as investigações devem ser promovidas pelas polícias civis, dirigidas por delegados de carreira. E no caso da Justiça Eleitoral, pela Polícia Federal. “Não creio que possa o MP colocar a estrela no peito e a arma na cintura e partir para investigações”.

O ministro Gilson Dipp e a ministra Nancy Andrighi votaram com a relatora.

BB/LF

Processo relacionado: Respe 36314" Matéria copiada do site do TSE - notícias 13/09/11

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Direito Penal do fato!

O HOMEM RESPONDE PELO QUE FAZ E NÃO PELO QUE É. PRINCÍPIO DO ATO E NÃO DO SER. PARA O DIREITO, SER É AGIR: SER CRIMINOSO É PRATICAR UM CRIME.”
(EVERARDO DA CUNHA LUNA, Capítulos de Direito Penal, Parte Geral, Saraiva, São Paulo, 1985,  p. 34)

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Não haverá culpa penal por presunção, nem responsabilidade criminal por mera suspeita

Não haverá culpa penal por presunção, nem responsabilidade criminal por mera suspeita. Meras conjecturas sequer podem conferir suporte material a qualquer acusação estatal. É que, sem base probatória consistente, dados conjecturais não se revestem, em sede penal, de idoneidade jurídica, quer para efeito de formulação de imputação penal, quer para fins de prolação de juízo condenatório. Torna-se essencial insistir, portanto, na asserção de que “por exclusão, suspeita ou presunção, ninguém pode ser condenado em nosso sistema jurídico-penal”, consoante proclamou, em lapidar decisão, o E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo” (HC n.º 84.409/SP, Rel. para acórdão Min. Gilmar Mendes, DJ 19.08.2005).

terça-feira, 12 de julho de 2011

Dados obtidos por quebra de sigilo não fundamentada devem ser retirados de processo - STF


FONTE: Notícias STF
Terça-feira, 28 de junho de 2011
Dados obtidos por quebra de sigilo não fundamentada devem ser retirados de processo
Por unanimidade, a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) concedeu parcialmente, nesta terça-feira, o Habeas Corpus (HC) 96056, impetrado por sete comerciantes pernambucanos contra decisão da 4ª Vara Criminal de Pernambuco, que determinou a quebra de seus sigilos bancário e telefônico. O juízo pernambucano aceitou as provas obtidas por esse meio para embasar a denúncia do Ministério Público contra eles por suposto crime contra o sistema financeiro nacional, lavagem de dinheiro e formação de quadrilha.
Tais crimes teriam sido cometidos por meio da evasão de divisas por operação cambial não autorizada, realizada por instituição financeira clandestina e movimentação de valores fora da previsão legal.
A Turma endossou voto do relator, ministro Gilmar Mendes, no sentido de que a quebra dos sigilos bancário e telefônico não foi devidamente motivada pelo juiz de primeiro grau e, portanto, os dados obtidos pelas interceptações telefônicas e quebra de sigilos bancárias ilícitas devem ser desentranhadas dos autos do processo.
Por outro lado, a Turma não conheceu a alegação de que não houve despacho do juiz autorizando as empresas de telefonia a prorrogarem as interceptações telefônicas. Isso porque entendeu ter havido perda de objeto, porquanto a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5, sediado em Recife) já havia concedido ordem de HC nesse sentido.
Alegações
O caso chegou ao STF depois que o TRF e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) negaram pedidos de HC quanto às supostas violações de sigilo, ante o entendimento de que a autorização judicial de interceptação estava de acordo com os fundamentos jurídicos formulados pelo Ministério Público. O STJ entendeu suficiente a motivação para quebra do sigilo bancário e a interceptação telefônica.
O relator do HC no Supremo, ministro Gilmar Mendes, entretanto, entendeu que a mera alusão aos argumentos apresentados na denúncia contra os comerciantes pelo Ministério Público “afigura-se completamente desarrazoada, não passando pelo crivo do julgamento da legitimidade, mesmo”. Portanto, segundo ele, não é motivo para ruptura da privacidade das pessoas sob investigação.
O ministro lembrou que a jurisprudência do STF é clara no sentido de que, para aceitação de uma denúncia, ainda mais contra um grupo de pessoas, não é necessária a fundamentação pormenorizada de cada alegação ou prova, bastando uma fundamentação sucinta. Mas, segundo ele, “não se deve confundir fundamentação sucinta com a completa falta de fundamentação”, falha esta por ele apontada neste processo.
Segundo o ministro Gilmar Mendes, a quebra de sigilo é uma excepcionalidade, já que a privacidade é um direito fundamental assegurado pela Constituição.
O HC foi protocolado no STF em setembro de 2008 e, naquele mesmo mês, o então relator, ministro Cezar Peluso, negou pedido de liminar nele formulado.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Habeas corpus pode ser usado contra decisão que negou progressão de regime - STJ

FONTE: SITE DO STJ - 07/07/2011 - 09h03
DECISÃO
Habeas corpus pode ser usado contra decisão que negou progressão de regime
O habeas corpus é meio jurídico válido para contestar decisão de juízo de execução que nega progressão de regime de condenado. A liminar concedida pelo vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Felix Fischer, no exercício da Presidência, determina que o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) julgue o mérito de pedido apresentado naquele tribunal.

O TJSP havia negado o habeas corpus original sob o argumento de que a medida cabível contra a decisão do juízo de execução negando a progressão de regime de cumprimento da pena seria o agravo estabelecido no artigo 197 da Lei de Execuções Penais. Mas, o ministro Felix Fischer discordou do entendimento da corte local.

Para o vice-presidente do STJ, apesar de existir a previsão de recurso específico do agravo em execução para a situação, é possível usar o habeas corpus para remediá-la, diante da possibilidade de lesão ao direito de locomoção do condenado.

O processo será remetido ao TJSP para julgamento do mérito do pedido apresentado pela Defensoria Pública como entender devido, afastada a impossibilidade de apreciá-lo em razão da existência do recurso específico. 

Apenado não pode ser submetido a regime de pena mais rigoroso que o imposto na condenação - STJ

FONTE: SITE DO STJ, notícia de 06/07/2011 - 18h06
DECISÃO
Apenado não pode ser submetido a regime de pena mais rigoroso que o imposto na condenação
Se a localidade não dispõe de estabelecimento adequado para o atendimento ao regime de pena estabelecido na condenação, o apenado não pode ser submetido a cumprimento em modo mais rigoroso. Com esse entendimento, o vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Felix Fischer, no exercício da Presidência, concedeu liminar para que o condenado a regime aberto cumpra a pena em prisão domiciliar.

A juíza de primeiro grau havia concedido progressão de regime ao condenado, para que passasse a cumprir a pena em casa do albergado. Mas, como na cidade não há esse tipo estabelecimento, estabeleceu que a pena restante fosse cumprida em prisão domiciliar.

Em recurso do Ministério Público gaúcho, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) reformou a decisão, por entender que o apenado não atendia aos requisitos legais para prisão domiciliar, estabelecidos no artigo 117 da Lei de Execuções Penais.

Para o ministro Felix Fischer, é inquestionável a ocorrência de constrangimento ilegal no caso de o condenado ser forçado a cumprir pena em condições mais graves que as estabelecidas na condenação. “Se o caótico sistema prisional estatal não possui meios para manter o detento em estabelecimento apropriado, é de se autorizar, excepcionalmente, que a pena seja cumprida em regime mais benéfico, in casu, o domiciliar”, afirmou.

“O que é inadmissível, é impor ao paciente o cumprimento da pena em local reservado aos presos em regime semiaberto, por falta de vagas em casa de albergado, ou mesmo devido à sua inexistência na localidade”, concluiu o ministro.

A decisão vale até o julgamento do mérito do habeas corpus apresentado pela Defensoria Pública. O caso será julgado pela Sexta Turma, com relatoria do ministro Sebastião Reis Júnior. 

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Prisão Temporária - o uso e o abuso - TJMG

Númeração Única: 0448497-94.2010.8.13.0000
Processos associados: clique para pesquisar
Relator: Des.(a) AGOSTINHO GOMES DE AZEVEDO
Relator do Acórdão: Des.(a) AGOSTINHO GOMES DE AZEVEDO
Data do Julgamento: 28/10/2010
Data da Publicação: 29/11/2010
Inteiro Teor:  

EMENTA: HABEAS-CORPUS - PRISÃO TEMPORÁRIA - INSUBSISTÊNCIA DOS REQUISITOS AUTORIZADORES DA MEDIDA EXCEPCIONAL - REVOGAÇÃO - NECESSIDADE - ACESSO AOS AUTOS DO PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO - DIREITO DO DEFENSOR - GARANTIA DA AMPLA DEFESA - SÚMULA VINCULANTE Nº 14 DO STF - HABEAS CORPUS CONCEDIDO. - Se todas as medidas assecuratórias da eficiência da investigação preliminar foram alcançadas, não mais subsistindo os requisitos da prisão temporária decretada anteriormente, é de rigor a sua revogação. - O acesso aos autos do procedimento investigatório, ainda que findas as investigações, é direito do defensor e visa assegurar a ampla defesa. - Incidência da súmula vinculante nº 14 do STF. - Habeas Corpus concedido.
HABEAS CORPUS N° 1.0000.10.044849-7/000 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - PACIENTE(S): HCC - AUTORID COATORA: JD V CR INQUÉRITOS POLICIAIS COMARCA BELO HORIZONTE - RELATOR: EXMO. SR. DES. AGOSTINHO GOMES DE AZEVEDO
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª CÂMARA CRIMINAL do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, sob a Presidência do Desembargador DUARTE DE PAULA , na conformidade da ata dos julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, EM CONCEDER A ORDEM.
Belo Horizonte, 28 de outubro de 2010.
DES. AGOSTINHO GOMES DE AZEVEDO - Relator
NOTAS TAQUIGRÁFICAS
Proferiu sustentação oral, pelo paciente, p Dr. Bruno César Gonçalves da Silva.
O SR. DES. AGOSTINHO GOMES DE AZEVEDO:
Ouvi com atenção as palavras do ilustre advogado.
VOTO
Trata-se de habeas corpus, com pedido liminar, impetrado em favor do paciente HCC preso em virtude de cumprimento de mandado de prisão temporária expedido pelo Juiz de Direito da Vara de Inquéritos da Comarca de Belo Horizonte.
Alegou o impetrante, em síntese, que o paciente padece de constrangimento ilegal, já que o impetrado desnecessariamente decretou a sua prisão temporária, negando, ainda, à defesa, o acesso à referida decisão, em nítida ofensa ao Estado Democrático de Direito e aos preceitos constitucionais.
Aduziu que a prisão temporária do paciente foi decretada a partir de investigações realizadas em conjunto pelo Ministério Público e a Receita Estadual, denominada de "Operação Máfia Verde", para apuração de suposta prática de crimes de lavagem de dinheiro e formação de quadrilha, tendo como meio crimes funcionais diversos como corrupção ativa e passiva e prevaricação, ocorridos, em tese, no âmbito do Instituto Estadual de Florestas.
Sustentou que a segregação do paciente nos moldes em que foi decretada configura ''verdadeira ilegal, inconstitucional e absurda 'Prisão para Averiguação'!'' (sic f. 08).
Salientou que a decisão do impetrado de impedir à defesa o acesso ao decreto prisional, se equipara ''à decretação sem fundamentação qualquer'' (sic f. 08).
Defendeu que inexiste necessidade concreta da prisão para apuração dos fatos, já tendo sido, inclusive, implementadas medidas cautelares na Comarca de Várzea da Palma em desfavor do paciente, não havendo risco efetivo à instrução criminal.
Acrescentou que o paciente é primário, possui bons antecedentes, residência fixa, é candidato a deputado estadual em Minas Gerais, e está afastado do IEF desde setembro de 2009, razão pela qual inexistem motivos para a decretação de sua prisão provisória.
Requereu o deferimento da liminar e, ao final, a concessão definitiva da ordem, para que seja relaxada a prisão temporária decretada em desfavor do paciente, com a conseqüente expedição de alvará de soltura.
Juntou os documentos de f. 17/107.
O Em. Des. Júlio Cezar Gutierrez, em plantão, deferiu o pedido liminar (f. 109/111) e, requisitadas informações à Autoridade Coatora, foram elas prestadas às f. 141/145, sendo colacionados documentos à f. 146/152.
A douta Procuradoria-Geral de Justiça, no parecer de f. 154/158, opinou pela denegação da ordem com a cassação do provimento liminar.
Às f. 160, determinei a abertura de vista ao impetrante para conhecimento dos documentos de f. 146/152 referentes à prisão temporária do paciente e a conclusão concomitante com os habeas corpus dos demais corréus para julgamento na mesma sessão.
Às f. 162/163, foi juntada petição pelo causídico requerendo a concessão da ordem, confirmando-se a liminar anteriormente deferida.
É o relatório.
Decido.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da impetração.
Não vislumbro nos autos elementos concretos a justificar a necessidade da segregação cautelar.
Depreendo da análise detida dos autos, em especial dos documentos compilados à f. 141/152, que todas as medidas assecuratórias da eficiência da investigação preliminar foram alcançadas, não mais subsistindo os requisitos da prisão temporária decretada anteriormente, sendo, inclusive, deferido o pedido de vista aos advogados.
É cediço doutrinária e jurisprudencialmente que a prisão temporária serve exclusivamente para salvaguardar os interesses das investigações preliminares, perdendo a sua eficácia quando, assegurado o bom êxito da persecução ex judicio, chega essa ao fim.
Sobre o tema, trago os ensinamentos de Aury Lopes Jr.:
"(...) A prisão temporária possui uma cautelaridade voltada para a investigação preliminar e não para o processo. Não cabe prisão temporária (ou sua permanência) quando já tiver sido concluído o inquérito policial. Então, se já houver processo ou apenas tiver sido oferecida a denúncia, não pode permanecer a prisão temporária.
Trata-se de uma prisão finalisticamente dirigida à investigação e que não sobrevive no curso do processo penal por desaparecimento de seu fundamento. Encerrada a investigação preliminar, não se pode cogitar de prisão temporária. (...)" (in Direito processual penal e sua conformidade constitucional - 3. ed. rev. atual. e ampl. - Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2010, pág. 149).
Nesta linha de raciocínio, já se manifestou o colendo STJ:
''HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. INQUÉRITO POLICIAL. ART. 12 DA LEI 6.368/76. PRISÃO TEMPORÁRIA. OFERECIMENTO DE DENÚNCIA. INSUBSISTÊNCIA DO DECRETO.
1. Uma vez oferecida a denúncia não mais subsiste o decreto de prisão temporária, que visa resguardar, tão somente, a integridade das investigações.
2. Ordem concedida para revogar a prisão temporária decretada nos autos do processo n.º 274/2006, em trâmite na Vara Única da Comarca de Ipauçu/SP.'' (STJ - HABEAS CORPUS Nº 78.437/SP - 5ª TURMA - Relator: Minª. LAURITA VAZ, J. 28/06/2007, P. 13/08/2007)
E decidiu esta egrégia Corte:
'''HABEAS CORPUS'. ROUBO QUALIFICADO. BANDO ARMADO. PRISÃO TEMPORÁRIA. FASE DE INVESTIGAÇÕES POLICIAIS FINDA. REVOGAÇÃO. ACESSO DO ADVOGADO AOS AUTOS DE INQUÉRITO POLICIAL DIREITO DO CAUSÍDICO. ORDEM CONCEDIDA.- A prisão temporária está intrinsecamente ligada à imprescindibilidade das investigações policiais, somente podendo ser decretada, por consequência lógica, quando ainda pendente de conclusão o respectivo caderno investigatório.- É direito do defensor, no interesse de seu cliente, ter acesso amplo aos elementos de prova colhidos no inquérito policial. Inteligência do art. 7º, XIV, da Lei 8.906/94 e da Súmula Vinculante n. 14 do STF.'' (TJMG - HABEAS CORPUS Nº 1.0000.09.506331-9/000 - 2ª Câmara Criminal - Relator: Des. RENATO MARTINS JACOB, J. 26/11/2009, P. 04/12/2009)
Assim, desaparecendo os motivos ensejadores da prisão temporária, é de rigor a sua revogação.
Não se pode olvidar que, a qualquer momento, verificando o magistrado a quo a presença dos pressupostos e hipóteses autorizadoras da prisão preventiva, poderá decretá-la nos termos do art. 312 do Código de Processo Penal.
Noutro giro, impende salientar que, agiu acertadamente o magistrado singular ao permitir à defesa do paciente e aos advogados dos corréus, ainda que findas as investigações, o acesso aos autos do procedimento investigatório, pois como salientado na liminar por mim deferida, deve ser respeitado o direito fundamental à ampla defesa.
Com essas considerações, CONCEDO A ORDEM para revogar a custódia temporária do paciente HCC, ratificando a liminar anteriormente deferida.
Sem custas.
É como voto.
O SR. DES. DUARTE DE PAULA:
VOTO
Agradeço a participação do Dr. Bruno César Gonçalves da Silva e, da análise que fiz do processo, cheguei à mesma conclusão do Relator. Concedo a ordem.
O SR. DES. HÉLCIO VALENTIM:
VOTO
Sr. Presidente, ouvi com atenção a sustentação oral e, penso até que o ilustre advogado não deve nem se desculpar pelo excesso. O excesso aqui foi do próprio Estado. Não se admite que alguém seja preso sem fundamentação de cunho material, segundo reiteradas decisões dos tribunais superiores, menos ainda quando a decisão é secreta.
Portanto, toda vez que o advogado ou a parte forem impedidos de ter acesso, de conhecer as razões que levam a uma medida extrema, que não pode ser compreendida como a regra, como, de fato, tem sido tratado, infelizmente, nos dias atuais, ainda como um resquício vivo da ditadura, que se foi há muito tempo e da legislação que lhe era pertinente.
Eu tenho que, neste caso, a mensagem que fica é que o Tribunal de Justiça está vigilante e que, mesmo quando os juízes mais duros integram esta Corte, não há um único deles que não reconheça ao advogado, o direito que, finalmente, à parte, está estratificado na Súmula Vinculante nº14 do Supremo Tribunal Federal.
Com estas singelas colocações, estou acompanhando o em. Des. Relator e concedo a ordem.
SÚMULA :      CONCEDERAM A ORDEM.